Por mais que pareça paradoxal, a questão do desenvolvimento local tem assumido papel cada vez mais importante na pauta econômica dos governos de todo o planeta tanto maior o aprofundamento dos efeitos da globalização econômica. E isso não se dá por acaso. O processo de relocalização industrial que tomou impulso com a reestruturação produtiva do capitalismo nas duas últimas décadas levou gestores públicos de cidades e regiões dos mais diversos lugares do mundo a se comprometer com maior determinação na promoção do desenvolvimento local. Deste modo, aqueles que assistiram a debandada de empresas de seu território empenharam-se em revigorar a economia local em face do choque causado pela saída de capitais; de outra parte, tantos outros se engajaram no esforço para tornar seu território atrativo aos investimentos em constante migração em busca de menor custo de produção e mão-de-obra qualificada – ou seja, maior competitividade. Em entrevista a um importante veículo da área econômica, a diretora de governança pública e desenvolvimento social da OCDE, Lamia Kamal-Chaoui, explica essa transformação: “Há uma mudança importante na competição mundial por investimentos. São as cidades, e não os países, que vêm liderando esse processo" (As capitais da excelência. In: Portal EXAME ).
Nesse contexto, não é de se estranhar que nos últimos tempos a temática da eficiência econômica das aglomerações industriais, dos arranjos produtivos locais, tenha ganhado especial relevância tanto na ação dos governos, quanto na produção intelectual. Afinal, conforme analisa Christian Ketels, do Instituto de Estratégia e Competitividade da Universidade Harvard, os melhores exemplos de cidades que se destacaram na nova ordem globalizada são daquelas que souberam aproveitar sua vocação econômica; na visão desse pesquisador, a melhor estratégia para a governança do desenvolvimento local "é saber o que é que uma cidade ou região tem que nenhum outro lugar poderia reproduzir, e reforçar isso" (Ibidem). A identificação – e o fortalecimento – da vocação das cidades passa, assim, a ser encarada como fator-chave para o seu desenvolvimento e, por conseguinte, para a competitividade de sua estrutura produtiva. A recente projeção econômica de inúmeras cidades ao redor do mundo é exemplar neste sentido, como ilustram os casos de Bangalore (Índia), Austin (EUA), Ulsan (Coréia do Sul) e São José dos Campos (Brasil), entre tantos outros.
Os argumentos de Kamal-Chaoui e Ketels são corroborados pelo economista Gilson Schwartz , para quem “nos últimos anos há evidências crescentes de que o foco prioritário deveria ser o desenvolvimento local - municipal ou mais restrito” (É possível reviver o desenvolvimentismo?. In: Revista Época, n. 444, 20.11.2006). Segundo Schwartz “discutem-se modelos nacionais, porém, a ênfase hoje é nos arranjos produtivos locais”. Esta seria a marca distintiva do novo estilo de desenvolvimento da era da globalização; estilo este que exige não apenas uma maior articulação entre agente públicos e privados, mas níveis cognitivos que vão além da mera dimensão econômica: aspectos históricos, antropológicos e da psicologia social são igualmente importantes para a apreensão dos elementos da cultura local imprescindíveis à promoção do desenvolvimento sob bases sustentáveis.
Agnaldo de Sousa Barbosa - Professor e pesquisador da UNESP/Franca, onde coordena o LabDES - Laboratório de Estudos sobre Desenvolvimento e Sustentabilidade
* Versão ampliada deste texto foi publicada na revista Política Democrática, n. 21, jul/2008, pp. 101-108 (Brasília-DF: Fundação Astrojildo Pereira)
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